«Vou morrer?», foi a primeira pergunta que Marleen Scheurs, Maastricht, então com 52 anos, fez em 2002 quando a biopsia mostrou que tinha um tumor maligno no peito. «Pensei no meu filho. E na minha mãe, que já tinha perdido dois dos seus filhos. Não queria causar-lhe mais desgostos.»
O cancro da mama de Scheurs foi descoberto durante o Programa de Rastreio Nacional de Cancro da Mama. Segundo o resultado, «o tratamento devia poder salvar o peito». Mas se o tumor não fosse removido totalmente, Scheurs teria de o perder. Logo que saiu da anestesia, ela percorreu o seu peito com a mão. Não teve a certeza. As ligaduras espessas não ajudaram. «Mas o que realmente não interessava era ficar melhor», diz ela. «Foi só um ano depois, quando a minha irmã teve de se submeter a uma mastectomia, que eu dei valor ao facto de ainda ter o meu peito. Ela era levada a pensar a lembrar-se dele todos os dias. Eu não tenho de pensar tanto nisso.»
O cancro da mama é o cancro mais comum nas mulheres. Pelo menos, uma em cada nove mulheres será afectada durante a sua vida. Aproximadamente 3000 mulheres morrem todos os anos desta forma de cancro. Antes de 2000, era uma das causas mais comuns de cancro nas mulheres com menos de 50 anos. Os novos desenvolvimentos no rastreio, diagnóstico e tratamento levaram a uma queda no número de casos fatais. Mas ainda, os métodos de tratamento melhoraram claramente. A questão deixou de ser a remoção do tumor e de grande área do tecido adjacente «só por segurança»; hoje, a norma é um tratamento intensivo mais focado em cada paciente individualmente e ajustado a cada uma delas.
No caso de Scheurs, o tecido adjacente não tinha cancro. Ela recebeu tratamento de radiação e recorda: «O oncologista aconselhou-me a fazer também quimioterapia, mas decidi não a fazer. Tenho uma doença auto-imune, e se fizesse quimioterapia, demoraria anos a recuperar o meu fígado. Foi uma decisão difícil, e foi por isso que pedi uma segunda opinião.»
A opção de fazer ou não quimioterapia tem prós e contras nos dois casos. «A alguém que não tenha a certeza, eu aconselharia a continuar a procurar respostas; a investigar o mais possível.»
Agora, sete anos depois, parece que a recusa da quimioterapia foi a decisão certa. Marleen Scheurs sente-se bem e goza plenamente a vida.
Genes mortais
No final de 2007, Michou Van der Meulen não pensou no pior quando sentiu um caroço no seu peito direito. A secretária, de 27 anos, da Hoofddorp, ficou chocadíssima quando soube que o tecido maligno iria evoluir rapidamente para um tumor canceroso se não fizesse a intervenção cirúrgica. «É algo que não se espera nessa idade», diz ela. Decidi imediatamente avançar para a cirurgia e pensei que em breve voltaria à minha vida normal.» Mas foi assim. O tecido contaminado foi removido com sucesso e perguntaram a Van der Meulen se gostaria de fazer o teste do gene do cancro da mama. Os seus médicos estavam preocupados porque ela era muito nova; o cancro só muito raramente afecta mulheres com menos de 30 anos. «Eu tinha uma hipótese em vinte. Havia um historial de cancro na minha família, mas a minha irmã e a minha mãe (ainda) não tinham sido atingidas.»
Os resultados da análise foram muito claros: «Eu tinha o gene do cancro, e a questão não era se eu iria ter cancro, mas sim quando é que ele se desenvolveria. Aparentemente, a minha mãe também transportava o gene.»
Outros exames revelaram que as duas mamas estavam cheias de minúsculas partículas de cálcio, que podiam ser o começo do cancro. «Tive de tomar a decisão difícil de fazer uma mastectomia dupla aos vinte e oito anos como medida de prevenção. Sei que há vinte anos atrás este gene mortal não tinha sido descoberto e que provavelmente eu teria morrido de cancro. Pelo menos, fui poupada a isso.»
Rastreio melhorado
O Dr. Jan Klijn, professor de Oncologia, assistiu a grandes mudanças durante a sua carreira: «Quando eu comecei, nos anos de 1960, o cancro era tabu. As pessoas adiavam a ida ao médico e falavam apenas sobre o grande C. quando um doente era diagnosticado com cancro, era muito normal falar com a família sobre se deveriam manter segredo ou não. Muito simplesmente, isso não acontece hoje em dia.»
O Prof. Klijn viu morrer doentes que hoje teriam boas hipóteses de recuperação. «Por exemplo, tem havido grandes avanços no processo de rastreio», explica.
«A chegada da mamografia digital, agora utilizada no rastreio, é um outro passo na direcção certa. Mas os resultados realmente espectaculares chegam com o rastreio MRI. Por exemplo, nos casos das mulheres jovens que têm um risco acrescido de cancro da mama dada a sua história familiar, conseguimos detectar anomalias em estágio inicial muito melhor do que com a mamografia.»
Personalização
Não é apenas o rastreio do cancro da mama que deu grandes passos nas últimas décadas; o tratamento com medicação é agora totalmente diferente: «Temos visto os resultados mais espectaculares com o Herceptin, que foi introduzido na Holanda no ano 2002.»
O Prof. Klijn foi o primeiro a introduzir este medicamento naquele país. O Herceptin, um chamado bioquímico, pode ser usado em aproximadamente 20% das doentes de cancro da mama. O Herceptin liga-se à proteína que estimula o crescimento de um tumor e depois começa a reduzir o seu crescimento. Pertence a um novo grupo de medicamentos conhecidos por terapia molecular dirigida. «Estas terapias bloqueiam o agente específico do crescimento no interior da célula.»
A terapia mais antiga do cancro da mama, a terapia hormonal, está agora a ser aplicada com mais frequência e com maior sucesso. «É aqui que está o futuro, em conjunção com a combinação correcta de medicação», diz o Dr. Klin. «Não existem dois cancros da mama idênticos. Identificando o tipo de cancro da mama e aplicando o tratamento apropriado a esse tipo específico, a batalha pode ser ganha. Em princípio, dentro de vinte anos nunca mais ninguém terá de morrer de cancro da mama.
Isto não significa que a cirurgia deixe de ser necessária, mas também nesta área está a haver um grande progresso. Há agora muito maior preocupação com os aspectos estéticos do cancro da mama. «Há vinte ou trinta anos, todos os tecidos, incluindo o tecido muscular, eram removidos. Só ficava uma fina camada de pele por cima da caixa torácica », diz a Dr.ª Hester Oldenburg, cirurgiã oncologista no Hospital Antoni Van Leeuwenhoek, de Amsterdão. «Mas as técnicas de redução oncoplásticas têm sido muito bem sucedidas. Hoje, o tamanho do peito é reduzido do mesmo modo que numa intervenção normal para redução do mesmo. Apenas é removido o tecido maligno. O outro peito, são, será reduzido para o mesmo tamanho, ou na mesma altura após o tratamento pós-operatório.»
Processo «sentinela» do gânglio linfático
O Prof. Dr. Emiel Rutgers, director de Oncologia Cirúrgica do Centro Médico Universitário de Amsterdão e também cirurgião, recorda que todas as doentes de cancro da mama tinham de submeter-se a uma remoção de todos os gânglios linfáticos axilares. «Na maior parte dos casos, porém», diz ele, «descobria-se que os gânglios linfáticos não estavam contaminados. Portanto, a cirurgia não era necessária. E a doente era deixada com todos os desagradáveis efeitos secundários, como dores, um braço inçado ou reduzida mobilidade do ombro.»
Em 1992, Rutgers ouviu falar do processo «sentinela» do gânglio linfático, um processo que envolve a remoção de apenas alguns dos gânglios, em vez da remoção de todos. «A metastização dos gânglios linfáticos é feita sempre do mesmo modo», explica ele. Há uma ligação directa entre a área do tumor e um ou dois, à vezes três, dos gânglios linfáticos que circundam o peito, os gânglios linfáticos «sentinela». Se estes gânglios são removidos e estão limpos, então a cirurgia de ablação axilar radical não será necessária. Se houve metastização, os restantes gânglios linfáticos devem então ser tratados. As probabilidades de a metastização progredir são cerca de 20%. «Este método pode evitar que 80% das dentes tenham de submeter-se a uma cirurgia de ablação axilar radical desnecessariamente», diz Rutgers. «Estamos a usar este método há quase dez anos e descobrimos que apenas três em mil doentes com um gânglio linfático “sentinela” limpo sofrerão de metastização axilar.»
Clínicas de mamografia
A luta conta o cancro da mama está a ser travada em todas as frentes. Enquanto o diagnóstico costumava demorar cerca de duas a três semanas, a ansiedade pode agora desaparecer no espaço de um ou dois dias nas muitas «clínicas de mamografia» especializadas. «É frequente a doente ter alta no dia seguinte à cirurgia, enquanto antigamente teria de permanecer hospitalizada entre duas e três semanas», diz Oldenburg.
«Nos últimos anos, conseguimos tornar a radioterapia mais precisa e, portanto, mais eficaz», diz o Prof. Dr. Harry Bartelink, especialista em radioterapia. Bartelink chefiou um grande projecto de investigação europeu que envolveu 5000 mulheres que fizeram dois tratamentos com radiação pós-operatória, um dos quais com dosagem elevada. «A dosagem extra conduziu à redução em 40% da probabilidade de o tumor não regredir após a cirurgia sem remoção do peito. Isto apresenta vantagens especialmente para mulheres jovens que sofrem de cancro da mama. Acontece também que mais de 80% das doentes ainda estão vivas passados dez anos. É uma coisa de que podemos realmente orgulhar-nos.
Cancro da mama nos homens
Menos de 1% dos diagnósticos de cancro da mama afectam os homens. Sandra Kloezen, directora da Sociedade Holandesa do Cancro da Mama, diz: «A investigação demonstrou que os homens tendem a ignorar os sinais do cancro da mama quando se trata deles próprios. Como o peito dos homens é plano, logicamente o cancro da mama será descoberto mais cedo. O caroço no peito pode ser detectado mais cedo, mas o perigo da metastização dos tecidos adjacentes (pele ou músculo) é maior do que nas mulheres. A falta de tecido gordo encoraja as células malignas a espalharem-se mais depressa na pele ou nos músculos do peito. É vital consultar o médico o mais rápido possível. O cancro da mama nos homens é raro, mas pode ser fatal se for descoberto demasiado tarde.»
Editado para o blog por Eunice Tomé
Sem comentários:
Enviar um comentário